A gente, quando está iniciando em uma profissão, sempre busca um modelo, uma referência. Eu já tinha lido uns dois livros do Antônio Torres e ouvido falar bastante das três letrinhas da DPZ. Mas esse cara era o assunto em todas as conversas de que eu participava com meu primeiro chefe, o Mauro Matos, e com o meu mentor maior, o Henrique Meyer. Obviamente, conhecê-lo se tornou rapidamente uma obsessão para mim. Tratava-se de Carlos Pedrosa. Na época, ele era Diretor de Criação na Premium, a agência de publicidade das lojas Ducal e da gigante do ramo imobiliário Sergio Dourado.
Em uma bela noite de verão, esta oportunidade surgiu. Passei o dia todo distraído, devo ter escrito alguns anúncios bem ruins naquela tarde, já que eu só queria que o dia terminasse logo porque eu iria finalmente conhecer o grande ídolo. E assim, junto com o parceiro de trabalho com quem formava uma dupla, também jovem e ávido por conhecer o Pedrosa, parti para o local onde haveria uma festa do Clube de Criação do Rio de Janeiro. Logo que cheguei, localizei o alvo, em um canto do salão, numa rodinha de colegas em animada conversa.
Foi um sacrifício ficar de longe, observando, medindo minhas possibilidades de ser apresentado a ele. Ele falava com um, depois com outro, mas nunca ficava sozinho. Eu espreitava e aguardava a minha oportunidade. Para minha alegria, notei que ele se afastava do grupo e caminhava em minha direção, provavelmente a caminho do banheiro. Mal ele se aproximou, pulei à sua frente, estendi a mão e disse: “Carlos Pedrosa, muito prazer. Sou seu admirador e é uma honra apertar a sua mão.” Ele, simpático, me estendeu a mão e me deu um forte aperto. Emocionado, sem pensar em coisa melhor a dizer, eu balbuciei, engasgado em comoção: “Nunca mais eu vou lavar esta mão!” Ele me olhou, com ar maroto, e soltou essa: “Então, eu nunca mais vou apertar a sua mão.”
Apesar desse começo embaraçoso, mantive uma relação de amizade bastante positiva com o mestre Pedrosa, onde cheguei a fazer pausas a caminho da Artplan, na Lagoa, para tomar um café e bater papo com ele, na Esquire/Oliveira, Murgel, ali em frente. Era um sujeito divertido, culto, educadíssimo. E eu adorava ser amigo dele.
À essa altura eu já tinha uma boa bagagem profissional, era Diretor de Criação na Artplan e já estava bem íntimo dos grandes nomes da publicidade brasileira, ele incluído. Sempre que nos encontrávamos era uma excelente possibilidade de grandes papos e muito bom-humor.
Até que, alguns anos depois, estávamos na mesma festa do Prêmio Colunistas, no Hotel Intercontinental, no Rio de Janeiro. O Márcio Ehrlich, em parceria com uma operadora patrocinadora da festa, resolveu sortear aparelhos celulares entre os mais premiados. Adivinha quem foi um dos sortudos? Exatamente o meu grande ídolo, Carlos Pedrosa. Muitos aplausos, a pose para as fotos, e ele voltou para a sua mesa, junto aos colegas da Contemporânea, onde agora trabalhava.
A noite transcorria bem, a festa estava ótima, mas eu sempre com o olhar voltado para aquele personagem, notei que ele estava muito quieto. Enquanto todos conversavam animadamente, aplaudiam os premiados de cada categoria, ele estava cabisbaixo, olhando para o aparelho celular que havia ganhado há instantes. Era um belíssimo aparelho da Nokia, esmaltado, que se abria em um leve deslizamento, liberando o teclado para uso. Na época, os celulares eram pretos ou cinzas, sem graça, e aquele era uma peça de design sofisticado.
Acabada a festa, me despedi dos colegas da Giovanni, FCB, onde estava trabalhando, e estava quase indo embora quando fui abordado pelos sócios da Contemporânea. Eles queriam me convidar para o jantar de comemoração das premiações da agência. Uma honra especialíssima, já que eu nem trabalhava na empresa. Dali, eu iria com eles jantar em um restaurante no Leblon. Na hora de nos dividirmos nos carros, o Pedrosa resolveu ir comigo, no meu carro. Para mim, foi um grande prazer, já que poderíamos aproveitar o trajeto para colocar o papo em dia. Eu sempre aprendia alguma coisa nessas gostosas conversas com ele. Mas ele ficou calado a viagem toda. Só olhava para o tal aparelho celular em sua mão, com um cigarro apagado nos lábios. Silêncio. Constrangimento.
Estávamos quase chegando ao restaurante quando ele finalmente se dirigiu a mim. “Você pode, por favor, me ajudar a desvendar um mistério?” Eu, quase eufórico, respondi que sim, claro. Ele, ainda com o cigarro apagado nos lábios, olhou pra mim, com olhos quase pidões, e implorou: “Me ensina como é que funciona esse isqueiro, que eu estou louco pra fumar e não consigo descobrir!” Depois desse momento inesquecível, o jantar foi agradabilíssimo e o Pedrosa, a todo instante, conferia, encantado, o seu novo aparelho celular. E pedia fogo para acender os cigarros a quem estivesse por perto.
Toninho Lima é publicitário, escritor, palestrante, líder criativo de diversas grandes agências. Nos últimos 30 anos, teve diversas participações em palestras, eventos e workshops em diversas entidades de classe e universidades, além de fazer parte do quadro de professores na Miami Ad School .
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